terça-feira, 30 de agosto de 2016

Vórtice negentrópico automonitorador espontâneo. 21

----- Why so pale and wan, fond lover (?) ----, Gisele perguntou-me, sentada ao meu lado no caminhão. Meu pau estava mais duro que um nó de pinho, pulsando por debaixo do meu jeans. A passagem de uma moça de óculos escuros na rua me deixara assim. Ela não me olhara intensamente (é verdade) mas tinha uma curiosidade fascinante, incrível, no olhar. É que o olhar dela não se dirigia a minha pessoa, nem ao meu corpo como eros, mas abstrata e especialmente à minha  ''espécie espiritual'' ; ela havia me despojado do meu corpo com seu olhar, em prol do germe raro do meu espírito. Gisele não gostou nada daquilo: ------ Provavelmente, ela só precisa lançar um rolo de tripa desde o quarto dela até o bar francês que a bichinha aqui começa a bombear sangue na pica(.) -----, ela disse. Passou a mão na minha braguilha e berrou nos meus ouvidos : ------ Posso tomar seu pulso, com a mão aqui (.) -----, infelizmente, naquele momento,  Gisele estava dominada por preconceitos visíveis: materialismo rasteiro, ausência de simbolismo, nível significante restrito. Todos sabiam (no meu comitê de campanha) que aquele tipo de grosseria baixava o moral de nossos quadros. No entanto, fiz bem em não rejeitar de imediato o instinto primitivo revelado por suas palavras. Depois de alguma reflexão, concluí que fôra uma amostra bem-sucedida de zombaria. ----- Ainda pulsando (?) ----- , ela contestou, com sangue no olhar. Os freios do caminhão cuspiam ozônio enquanto ela delirava com as entranhas violáceas da passante escapando por um talho de vinte centímetros que a conectava à minha mente animal. ----- She is trampling out the vintage where the grapes of wrath are stored; she has loosed the fatefull lightning of his terrible swift sword (.) ------, eu disse. Pintura do ciúme na base do realismo socialista. Gisele com o dedo erguido, dominadora, proscrevendo todo significante com fúria. Ela passava o tempo todo em que estávamos juntos preocupada com sua reputação de designer de moda, materialismo dogmático e escotomização da linguagem andando de mãos dadas. Fechei os olhos e exalei lentamente, como se precisasse expelir cada palavra xula dela dos meus pulmões. '' As crises de ciúme próximas demais '', pensei ''' são realmente perigosas para uma campanha eleitoral ''. Mal sabia eu que, de volta ao hotel, minhas observações seriam multiplicadas por uma ordem de magnitude intolerável. Quando Gisele estava prestes a incrustar uma pedra preciosa em uma jóia de sua coleção chinesa, aconteceu o óbvio: ----- Diamantes, esmeraldas, pérolas, rubis e safiras de ''haute monde'', tudo empenhado uma a uma e substituídas por réplicas de qualidade duvidosa (.) Até quando, K (?!) ------, ela protestou. Histérica, começou a examinar suas pedras preciosas como um cidadão procurando lepra no próprio corpo. ----- Meu rubi-sangue-de-galinha (!) Minhas opalas negras (!) Minha SAFIRA (!!) -----, poule de luxe quase pré-histórico.  ------ E você aí (continuou ela) como uma espécie de michê barato (!) ------ 

Naquele momento, entraram em cena as forças do Mal.  ----- Um Cinturão (expliquei-lhe) Uma Rota. A demanda chinesa vai intensificar os conflitos no Mar do Sul e as estatais deles abrirão novos mercados no exterior comprando tudo que puderem mundo afora. Tudo subvencionado pelo Governo, invocando a velha Rota da Seda. Eles barrarão o repatriamento de lucros das empresas estrangeiras na China e passarão a se comportar perante o mundo como uma Coréia do Norte atômica e gigantesca. Hálitos militares fortes e certa loucura de multiplicação de mercados. ''Eu sou o cão imperialista, eu sou o verme dos arrozais '' (!) -----, concluí. 

K.M.

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