Cada vez que se pretende estudar uma certa forma épica é necessário investigar a relação entre essa forma e a historiografia . Podemos ir mais longe e perguntar se a historiografia não representa uma zona de indiferenciação criadora com relação a todas as formas épicas. Nesse caso, a história escrita se relacionaria com as formas épicas como a luz branca se relaciona com as cores do espectro . Como quer que seja , entre todas as formas épicas a crônica é aquela cuja inclusão na luz pura e incolor da história escrita é mais incontestável . E, no amplo espectro da crônica , todas as maneiras com que uma história pode ser narrada se estratificam como se fossem variações da mesma cor. O cronista é o narrador da história . O historiador é obrigado a explicar de uma ou outra maneira os episódios com que lida , e não pode absolutamente se contentar em representá-los como modelos da história do mundo. É exatamente o que faz o cronista, especialmente através de seus representantes clássicos, os cronistas medievais , precursores da historiografia moderna. Na base de sua historiografia está o plano de salvação , de origem divina , indevassável em seus desígnios, e com isso desde o início se libertam do ônus da explicação verificável . Ela é substituída pela exegese, que não se preocupa com o encadeamento exato dos fatos determinados, mas com a maneira de sua inserção no fluxo insondável das coisas . Por isso aqui é comum a leitora sentir-se algumas vezes solitária durante sua leitura, ou ate mesmo mais solitária que qualquer outra leitora , pois se apoderando ciosamente da matéria lida, devorada como coisa sua , a tensão que atravessa a narrativa vem a se assemelhar muito à corrente de ar que alimenta e reanima sua chama.
K.M.
Nenhum comentário:
Postar um comentário