Deus inventou o amor para enganar os seres humanos e acabou enganando até a si mesmo. Uma divindade velha e abatida, cujos recursos minguaram com o tempo e os aborrecimentos da função . Ele continua vivo, claro, ainda que não pareça, quando tenta arrancar de sua memória infinita as últimas confissões . Mas com a chegada de alguns espectros superiores na Terra, pôde até mesmo manifestar, durante algum tempo, uma atividade mental de extraordinária intensidade. E até sua famosa Voz Inteiror, estrangulada, extenuada por éons de espera vã, de que tudo parecia indicar que se calara para sempre ---- misturada à dos fantasmas cósmicos recém-chegados, e estremecendo ao seu poderoso contato ---- reencontrou sua força, sua vitalidade, e pôde assim perpetrar ainda algumas trovoadas dignas de nota. Mas simplesmente, isso não muda tudo. Não é mais o mesmo Deus. E então acontece isto : Lúcifer retorna mais forte ao trono que sempre lhe pertenceu. Mais forte, e mais chocante ainda : sobre os despojos daquele personagem antigo, e agora carregando o mesmo nome que Ele (Deus) conserva sempre o mesmo rosto jovem, usurpando talvez até alguns dos traços singulares do caráter do Velho Deus fatigado. Começa assim a surgir na face da Terra um personagem ao mesmo tempo mais real e mai verdadeiro que Deus, uma espécie de Homem Abstrato que, perdido de sua milenar linhagem cósmica, e transportado no espaço e no tempo de seus novos companheiros de jornada, seria, subitamente, apenas o sósia glorioso do Outro.
K.M.
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