terça-feira, 6 de setembro de 2016
Sotorama (1)
Jesus Raphael Soto: volume suspenso, cinético. Pausa de silêncio, de movimento e de silêncio. Não apenas a realização de uma teoria, não apenas o resultado de uma pesquisa, mas um corpo auto-propulsor e auto-definido. O próprio autor declarava que ''o movimento era para ele uma RELAÇÃO e não um objeto que se mexe ''. Sua obra se baseia numa relação com o tempo e o espaço, relação de transcendência de ambos. Meditação, olhar oriental, ciente de que o dinamismo não exclui o apelo à descida profunda dentro do silêncio. Sua obra é uma resposta à concepção errada do movimento no Ocidente, que predomina ainda hoje na sociedade tecnológica. O Ocidente apreende o movimento apenas em sua relação com o lucro e as fainas de ''quebrar etapas'', desservindo os interesses autênticos do homem.
Bem sei que Marx, contrariando Leibniz, afirmou que ''a natureza poderá agora SALTAR ETAPAS''. Sob este ponto de vista, a obra de Soto opõem-se totalmente à mentalidade atual. Em suas esculturas cinéticas, para além de todo movimento, ele busca exaltar a calma. A profundidade atinge e modifica a percepção óptica. A riqueza das linhas, a ''verdade da luz '', a constância da geometria, , essa força de beleza que regenera e corrige tantas deformidades que podemos, nas palavras de Kandinsky, considerar ''abstratas''. Para além do ''environnement. A série dos ''penetráveis '' nos ajuda a compreender e explorar as possibilidades da visão. O espectador não está num lado e o mundo do outro, somos partes constituintes de uma realidade fervilhante de forças vivas e misteriosas, muitas das quais invisíveis. Estamos no mundo sem possibilidade de recuo diante da matéria-energia, energia-informação: dentro e não ''em face de''. Não há espectadores, só participantes.
Baudelaire: '' Je hais le mouvement qui déplace les lignes ''. O poeta não se irritaria diante do ''déplacement '' de Soto. Ali o movimento o ajudaria a interpretar o significado das linhas quando imóveis ---- sobretudo as verticais. Movimento que vai muito além do choque produzido por forças ou ritmos se encontrando. Conhecer a hora precisa da pausa, do intervalo, que renuncia aos gestos supérfluos, acentuando o aspecto civilizado de uma obra. Lucidez cujo esquema podemos entrever.
K.M.
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