sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Turcato nasceu para interrogar.



Teoricamente Giulio Turcato nasceu apenas para interrogar. Suas próprias afirmações surgem muitas vezes na forma interrogativa. No espaço mental de Turcato, o diálogo assume forma de monólogo: escavação de uma certa forma de realidade que escapa ao próprio protagonista Turcato, mostrando a grande dificuldade que é ser Turcato. Isto (obviamente) influi o no modo de Turcato ser pintor. Quantos de sus quadros não constituem enigmas-interrogações em branco, preto, vermelho, amarelo, azul violeta, linhas e traços sinuosos, ou propostas de interrogações como as que despontam (mutatis mutandis) em certas partituras musicais, e que se transferem por vias mágicas às pistas rotativas do céu estrelado. Seu jeito de esfinge, com voz de barítono e desvios de baixo profundo, emprega-o Turcato para interrogar um território de formas e linhas sibilinas, frágeis folhas de chá andando através do pincel mediador, interrogando até mesmo seus pontos de interrogação. O assunto só poderia ser discutido satisfatoriamente na presença de Pirandello, técnico do fenômeno de desdobramento da personalidade. Ontem mesmo utilizei a expressão ''doppel-ganger'', que no folclore alemão desígna uma espécie de duplo ou sósia da pessoa, geralmente com uma conotação maligna. Mas é claro: o tal das intransferíveis impressões digitais sempre está lá, oferecendo respostas subliminares às suas próprias perguntas que, rejeitando o lastro retórico do Homem-Prometeu, reduz a um simples fato de crônica as explorações espaciais mais complexas. Turcato retém delas somente a notícia das cores que espantaram os primeiros cosmonautas.

K.M.

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