quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Sotorama (3)


Na obra de Soto há uma palavra chave que é da maior importância: libertação. Tal palavra pressupõe muitas outras palavras antecedentes: Matéria; forma; visualidade; peso; volume; madeira; força; tela; metal; série; repetição; progressão; evolução; espaço; permutação; vibração; estrutura; cinética; dinâmica; múltiplo; panorama; environnement; muro; corredor; relação. Todas estas palavras constroem e servem a palavra libertação. Não está expressamente escrita em nenhuma de suas obras, mas vive ali duma vida forte, igual à si própria.

O canto plástico do amanhã sonhado e solicitado. Metamorfose do labirinto em libertação. A aurora pode ser coletiva, mudando o sonho em cotidiano. Libertação mais alta que evasão. A evasão, muitas vezes constrangedora, constitui uma necessidade até mesmo para os politicamente engajados. Mas a libertação é um fato prodigioso do espírito, a vitória sobre a falsa luz do mundo, sobre o opaco, o provisório, a Medusa. Libertar-se equivale a transmutar todos os valores, num devir maior. Já o Cristo, noturnamente, o afirmava à Nicodemus.  Mas no plano de Soto estamos dentro da história, só que preparados para escapar à sua tirania.  O que Jean Claude Lambert escreveu sobre a poesia, eu o aplico também à arte de JesusRaphael Soto: A poesia deve rebelar-se contra os falsos mitos fabricados pela história, A Propaganda, suas pompas e seus terrores ''. A obra de Soto exclui apalavra morte, muitas vezes presente na obra de grandes poetas. A palavra vida irrompe dela, limpa, facilitando a comunicação entre as diversas partes do todo e o  exterior.

Como ade todas as verdadeiras obras de arte, a linguagem de Soto está bem longe da simplicidade corrente, que exclui a profundidade , a complexidade e a dificuldade. É uma linguagem elevada, difícil, que no entanto alcança uma forma superior de comunicação. Lemos nos Upanishads (Isha) que ''O movimento do mundo desdobra-se sob a direção de uma contínua estabilidade. A mutação aparente traduz a infinita reciprocidade de todas as relações possíveis na Consciência imóvel ''. E ainda: ''Como cada objeto dentro do universo é verdadeiramente o universo inteiro sob um de seus aspectos inumeráveis, assim também cada alma individual é Brahma olhando-se ele mesmo e todas as coisas a partir de um centro de consciência cósmica. Isto é portanto não simples mas idêntico. Idêntico smpre e em toda parte, no tempo e no espaço, e além deles. Numericamente o único e o múltiplo são termos igualmente adequados à sua essencial identidade''.

K.M.


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