sexta-feira, 31 de março de 2017

A ''verdade efetiva da coisa ',' a que alude Maquiavel.

O espetáculo, ou a simples notícia de algum continente mal sabido e que, tal como a cera, se achasse apto a receber qualquer impressão e assumir qualquer forma, suporta assim , entre muitos deles, as idealizações mais inflamadas . Idealizações estas de que seria como um ''negativo ''' fotográfico este nosso mundo densificado e convulsionado, e em que parece voltar a ganhar atualidade histórica a possibilidade de remissão. Se isso é especialmente verdadeiro no caso de Colombo, que acreditava que o fim do mundo seria em 1656 , não o deixa de ser em outros navegantes que o antecederam ou sucederam. A maior parte deles sempre preferiu a essa cumplicidade com a ''verdade efetiva da coisa '', a que alude Maquiavel  (o reconhecimento da natureza básica do mundo ) , um ideal mais  limpo . Nas palavras do próprio Príncipe : ''Preferir o ''como se vive '' ao ''como se deveria viver '', ao ser um dever ser. E é bem compreensível , nestas circunstâncias, se numerosos marinheiros e exploradores que se movem , quase por necessidade de ofício, conforme os juízos dos astrólogos, tendam a fazer ''baixar seu dever '', os seus ''paraísos '', destes mesmos mundos arquetípicos mais puros  para a realidade ainda nublada que lhes oferecem as terras incógnitas e remotas. O processo mental que se encontra à base de semelhante atitude não é muito diferente do que, em certas obras de imaginação, escritas aproximadamente no fim do século XV , opõe a uma degradação da Natureza e do mundo moderno a nostalgia das imagens idílicas. Assim, numa das églogas, anterior a 1482, a célebre Arcadia de Sannazaro, apontando para o mundo que se agravava , evoca os tempos bons que de hora a hora se esgarçam :

Or vedi , Opico mio , se´l mondo aggravasi
di male in peggio ; e deiti pur compiangere
pensando al tempo buon che ognor depravasi

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