No auge de sua hegemonia mundial , o governo britânico não foi em socorro da Confederação (livre-cambista ) contra a União (ferozmente protecionista ) durante a Guerra Civil americana ---- deixou seus ex-colonos à vontade para massacrarem uns aos outros na mais sangrenta guerra travada sob a hegemonia britânica, e se concentrou , ao contrário, na consolidação de seu controle sobre o império indiano e no lançamento das bases da maior onda de colonizações que o mundo jamais vira . No auge de sua hegemonia, em contraste, o governo norte-americano colocou-se como substituto dos regimes ''livre-cambistas'' da Coréia do Sul e do Vietnã do Sul , em suas respectivas guerras contra os regimes da Coréia do Norte e do Vietnã do Norte . Ele estimulou ativamente a maior onde de ''descolonização '' que o mundo já vira '' (Bergesen ) . Esse impulso oposto da hegemonia norte-americana em relação à britânica reproduziu o padrão de regressão já evidenciado no desenvolvimento da hegemonia britânica . Assim como a expansão e a superação do Sistema de Westfália, sob a hegemonia britânica , haviam-se baseado em estratégias e estruturas de governo e acumulação em escala mundial que mais se assemelhavam às da Espanha Imperial do século XVI do que às da hegemonia holandesa, a expansão e a superação desse mesmo sistema , sob a hegemonia norte-americana, implicaram uma ''regressão '' a estratégias e estruturas de governo e acumulação em escala mundial que mais se assemelhavam às da hegemonia holandesa do que as da britânica . O ''anti-imperialismo '', assim definido , é uma dessas semelhanças. Embora os Estados Unidos tenham se formado através de um territorialismo ''interno'' sem precedentes , nem a hegemonia holandesa nem a hegemonia norte-americana basearam-se no tipo de ''império mundial territorial '' em que se alicerçara a hegemonia britânica. E , inversamente, a hegemonia holandesa e a dos Estados Unidos fundamentaram-se , ambas, na liderança de movimentos de autodeterminação nacional ---- um movimento estritamente europeu, no caso dos holandeses, e um movimento universal, no caso dos Estados Unidos ----, de um modo como nunca fizera a hegemonia britânica. É fato que a Grã-Bretanha conduziu as nações emergentes da onda norte-americana de autodeterminação nacional para uma ordem mundial do livre comércio . Mas essa ordem baseou-se na plena realização das inclinações imperialistas britânicas na Ásia e na África. Ao abandonar a via de desenvolvimento imperial britânica em favor de um territorialismo estritamente doméstico , os Estados Unidos reproduziram, em escala incomparavelmente maior , a via de desenvolvimento nacional mais típica da hegemonia holandesa . ''Considerações semelhantes aplicam-se ao impulso ''anti livre comércio '' da hegemonia norte-americana. Tem sido assinalado o desvio da hegemonia norte-americana dos princípios e práticas do liberalismo do século XIX, em favor de uma maior responsabilidade governamental na regulamentação econômica e no bem-estar dos cidadãos'' (Lipson ; Ruggie ; Ikenberry ) . A verdade é que o governo norte-americano nunca chegou sequer a considerar a adoção do tipo de livre comércio unilateral que a grã-Bretanha praticou desde a década de 1840 até 1931. O livre comércio ideologizado e praticado pelo governo dos Estados Unidos , em todo o período de seu predomínio hegemônico, tem sido antes uma ''estratégia de negociação intergovernamental '' (porque não ??) ---- bilateral e multilateral ---- sobre a liberalização do comércio, visando basicamente abrir as portas das outras nações aos produtos e às empresas norte-americanos. As crenças do século XIX no ''mercado auto-regulador '' --- no sentido de Karl Polanny --- só se converteram na ideologia oficial do governo norte-americano na década de 1980 , nas administrações de Reagan e Bush, em resposta à crise hegemônica dos anos 1970. Mesmo nessa época, porém ,foram muito limitadas as medidas unilaterais de liberalização do comércio efetivamente adotadas pelo governo dos Estados Unidos. O livre comércio não desempenhou papel algum na formação da ordem mundial da Guerra Fria. Longe de constituir a política que uniu os Estados Unidos e a Europa Ocidental , ''o livre comércio foi a questão que os dividiu . A Comunidade do Atlântico do pós-guerra só passou a existir depois que os Estados Unidos, impelidos por seu medo do comunismo russo , e tbm do comunismo europeu interno , eliminaram seus escrúpulos liberais , a bem da ''segurança mútua e da rápida recuperação da Europa. A economia ficou subordinada à política. O comércio recebeu instruções da bandeira. E a hegemonia da América sobre a Europa assumiu uma forma mais visível do que o imperialismo do livre comércio, e tbm uma forma mais útil e mais aceitável para os europeus '' (Calleo e Rowland )
K.M.
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