A forma norte-americana de hegemonia, mais útil e aceitável, afastou-se da britânica em muitos aspectos. Para começar, a moeda mundial passou a ser regulamentada pelo Sistema da Reserva Federal dos Estados Unidos, atuando em concerto com bancos centrais seletos de outras nações, em nítido contraste com o sistema oitocentista de regulamentação privada , baseado nas redes cosmopolitas da ''haute finance '', centradas em Londres, e controlado por elas. ''O sistema do dólar regulamentado pelo Estado conferiu conferiu ao governo dos Estados Unidos uma liberdade de ação muito maior do que o movimento britânico jamais tivera, nos termos da regulamentação privada do padrão ouro do século XIX '' (Mjoset ). Da mesma forma, o principal instrumento de formação do mercado mundial sob a hegemonia norte-americana, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT ), deixou nas mãos dos governos em geral, e do governo dos Estados Unidos em particular , o controle sobre o ritmo e a direção da liberalização comercial . Por nunca haverem renunciado ao uso dessa arma através do livre comércio unilateral, os Estados Unidos instituíram um regime comercial muito menos ''generoso '' para com o resto do mundo do que o britânico. Mas como assinalou Krasner ''enquanto os Estados Unidos operaram num nível mais alto na hierarquia das necessidades de seus aliados ---- como nas décadas de 1950 e 1960 ---- eles puderam permitir-se priorizar os objetivos da Guerra Fria e ser generosos nas negociações de rodadas sucessivas de liberalização comercial . Com isso, atingiu-se um grau muito mais amplo de livre comércio multilateral sob a hegemonia norte-americana, comparado ao da britânica. Mas o que acabou emergindo não foi um regime de livre comércio ; foi antes ''um arranjo improvisado de comércio mundial, que não é nem aberto nem autárquico '' (Lipson ) ... ou pior ainda : ''uma estrutura política desengonçada, feita de relações diplomáticas ad hoc entre o Japão , o Mercado Comum europeu e os Estados Unidos, e de acordos bilaterais entre estes e outros países menores '' (Strange ). Uma terceira diferença, muito mais fundamental, entre as hegemonias britânica e norte-americana tem sido a tendência de ''internalização '' de uma parcela expressiva e crescente do comércio mundial em empresas transnacionais de grandes dimensões e de hierarquização vertical, parcela esta que é administrada por elas. Não é fácil obter dados sobre esse ''comércio '' internacional , que na verdade consiste em transações intra-firmas . Mas várias estimativas indicam que a proporção do comércio mundial composto de transações intra-firmas elevou-se de algo da ordem de 20% a 30% na década de 1960 para algo da ordem de 40% a 50% no fim da década de 1980 e início da de 1990 . Segundo Robert Reich ,''em 1990 , mais da metade das exportações e importações da América, em valor, foram simplesmente transferências desses produtos e serviços correlatos dentro de corporações globais ''. Esse aspecto da hegemonia norte-americana reflete a centralidade do investimento direto, e não do comércio , na reconstrução da economia capitalista mundial desde a Segunda Guerra. Como observou Gilpin ''A essência do investimento direto das empresas multinacionais norte-americanas tem sido a transferência do controle administrativos de setores substanciais das economias estrangeiras para cidadãos norte-americanos . A expansão transnacional do capital das grandes corporações norte-americanas no século XX constitui outro aspecto da ''regressão '' da hegemonia dos Estados Unidos às estratégias e estruturas de governo e acumulação típicas da hegemonia holandesa. Por volta de 1970, quando começou a crise da hegemonia norte-americana, tal como encarnada na ordem mundial da guerra Fria, as empresas multinacionais haviam evoluído para um sistema de produção, intercâmbio e acumulação em escala mundial que não estava sujeito a nenhuma autoridade estatal e tinha o poder de submeter a suas próprias leis todo e qualquer membro do sistema inter-estatal, inclusive os próprios Estados Unidos .
K.M.
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